Paul McCartney: “Lançamos Sgt. Pepper´s na sexta e domingo Jimi Hendrix tocou o tema no Saville Theatre em Londres; os Beatles chegaram a um ponto em que implodiram - todos tinham dinheiro e fama e, de vez em quando, era inevitável que nos irritássemos uns com os outros.”
"Sempre
que me perguntavam como eu gostaria de ser lembrado, respondia "com um
sorriso". Mas gostaria que as pessoas entendessem o que eu fiz e pensassem
que há uma enorme força naquilo."
"Naquele domingo Jimi Hendrix tocaria no Saville Theatre no West End de Londres, e ele abriu o show com o tema de Sgt. Pepper's."
"Isso veio de uma história que tínhamos lido a respeito do Cadillac de ouro do Elvis fazendo turnê. Achamos que era uma ideia maravilhosa: ele não sai em turnê, só manda o Cadillac. Fantástico! Então, pensamos: "Vamos despachar um disco". E o resultado foi Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band"
"Foi o pior momento da minha vida, quando me informaram que não poderia me opor a esse tal de Allen Klein, esse "suposto empresário norte-americano". Como ele não era uma das partes de nenhum dos nossos acordos, precisei brigar contra os outros três caras."
"Esta é a pior parte de ficar adulto. Você perde amigos, é inevitável. Não é exatamente uma surpresa, mas é terrível. É muito triste."
"Eu me lembro do impacto de Sgt. Pepper's como algo
instantâneo e onipresente, tocando em toda casa noturna, toda loja de roupa,
toda loja de discos."
"Naquele domingo Jimi Hendrix tocaria no Saville Theatre no West End de Londres, e ele abriu o show com o tema de Sgt. Pepper's."
"Isso veio de uma história que tínhamos lido a respeito do Cadillac de ouro do Elvis fazendo turnê. Achamos que era uma ideia maravilhosa: ele não sai em turnê, só manda o Cadillac. Fantástico! Então, pensamos: "Vamos despachar um disco". E o resultado foi Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band"
"Foi o pior momento da minha vida, quando me informaram que não poderia me opor a esse tal de Allen Klein, esse "suposto empresário norte-americano". Como ele não era uma das partes de nenhum dos nossos acordos, precisei brigar contra os outros três caras."
"Esta é a pior parte de ficar adulto. Você perde amigos, é inevitável. Não é exatamente uma surpresa, mas é terrível. É muito triste."
A conversa franca de Paul McCartney com Anthony Decurtis,
da Rolling Stone americana, três anos atrás, toca em temas que ele pouco ou
nunca comentou em profundidade como o fim do grupo, a amizade retomada com
Lennon, a saudade de Harrison. Leia:
Como
foi o "verão do Amor" (1967) para você?
Legal pra caramba. Tínhamos acabado de decidir que
suspenderíamos as turnês porque já não estava mais valendo muito a pena.
Parecia que não estávamos progredindo, o público continuava berrando, mas a
gente se encheu daquilo. Tínhamos a ideia de fazer um disco que sairia em turnê
por nós.
Isso veio de uma história que tínhamos lido a respeito do
Cadillac de ouro do Elvis fazendo turnê. Achamos que era uma ideia maravilhosa:
ele não sai em turnê, só manda o Cadillac. Fantástico! Então, pensamos:
"Vamos despachar um disco". Passamos mais tempo em estúdio e o
resultado foi Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band (1967). Então, foi
maravilhoso. Estávamos amadurecendo? Não sei.
Olhando em retrospecto agora, éramos praticamente crianças,
apesar de nos sentirmos muito adultos. Tanta coisa tinha acontecido com tanta
rapidez desde a viagem dos Beatles para os Estados Unidos em 1964. Em essência,
aqueles três anos foram a diferença entre "I Want to Hold Your Hand"
e "Sgt. Pepper's."
Os tempos estavam mudando, como senhor Dylan disse. Só
estávamos seguindo nossos instintos, mas havia um grande arroubo de energia, as
ideias vinham rápidas e consistentes.
Todos os tipos de ideias novas - artísticas, políticas,
musicais. Começamos a escrever coisas que eram diferentes porque nossas
conversas, nossos pensamentos e nossos sentimentos eram diferentes. Estávamos
passando muito mais tempo longe da estrada, com outros artistas, e isso nos
permitiu investigar outras coisas.
Tínhamos muitos amigos no mundo da música e no mundo da
arte, e havia uma grande fertilização cruzada. Foi uma época ótima para
experimentar coisas e tudo isso penetrou na nossa música e no nosso estilo de
vida.
Eu me lembro do impacto de Sgt. Pepper's como algo
instantâneo e onipresente, tocando em toda casa noturna, toda loja de roupa,
toda loja de discos.
Você
fazia ideia de que teria esse tipo de efeito?
Foi ótimo, para falar a verdade. Como tínhamos parado de
excursionar, a mídia começava a sentir que as coisas estavam calmas demais, o
que criou um vácuo, de modo que puderam falar mal de nós. Diziam: "Ah, a
fonte secou". Mas nós sabíamos que não tinha secado. Sabíamos o que estávamos
fazendo e sabíamos que nossa fonte estava longe de secar.
Na verdade, o oposto estava acontecendo - vivíamos uma
enorme explosão de forças criativas. Nós pressentimos isso. Realmente não
comentamos o assunto com muita gente. Tocávamos uma demo aqui, outra ali [para
os amigos] e tal, mas o mundo de maneira geral não sabia de nada.
O que alguns críticos comentavam era "ah, eles estão
acabados". Enquanto isso, estávamos lá trabalhando com alegria, como os
Sete Anões - "Trabalho, trabalho, trabalho, trabalho, trabalho, trabalho,
trabalho!" [risos]. Estávamos nos divertindo muito, obviamente, montando
essa coisa.
Daí, quando saiu, foi fantástico. Naquela época,
costumávamos lançar [álbuns] na sexta-feira, e aquele fim de semana foi uma
coisa. Eu me lembro de ter recebido telegramas que diziam coisas como
"vida longa a Sgt. Pepper's!". Esse era o sentimento geral, e era
maravilhoso.
Naquele domingo Jimi Hendrix tocaria no Saville Theatre
no West End de Londres, e ele abriu o show com o tema de Sgt. Pepper's. Cara, o
disco estava mesmo em todo lugar! E é claro que nós só ficamos surfando naquela
onda artística. Foi bem bacana exercer tanta influência assim.
Como eu disse, era verão, e o sol brilhava e lá estávamos
todos nós, no maior astral [risos]! Eu me sinto muito privilegiado por ter
vivido aquilo, em primeiro lugar e, em segundo, por ter sido o epicentro dos
acontecimentos.
Deve
ter sido uma sensação muito estranha - passar por mudanças enormes e,
simultaneamente, gerar mudanças similares para milhões de outras pessoas.
Foi sobrenatural. Nós tínhamos nos acostumado com uma
parte disso simplesmente por sermos os Beatles. Até "I Want to Hold Your
Hand" tinha deixado as pessoas loucas. Mas em 67 a coisa passava para
outro nível.
Estávamos entrando no coração e na mente de todos.
Parecia muito que Sgt. Pepper's fazia parte do sentimento
daquela época em que, de algum modo, tudo iria se transformar, que nada jamais
voltaria a ser como antes.
É engraçado, conheço muita gente que, depois dos anos 60,
teve uma sensação de decepção que nunca passou. Eu pessoalmente achava que, ao
passo que tudo estava mudando, não necessariamente significava que tudo
mudaria. Nós tínhamos longas discussões a respeito de como um dia as pessoas da
nossa geração se tornariam primeiros-ministros e seria bem sobrenatural [para
eles] o fato de terem sido afetados por esse período.
Mas, ao mesmo tempo, éramos realistas, e pensávamos
"é, mas vão continuar sendo políticos". Dava para saber que tudo que
estava acontecendo no mundo mudaria a ordem das coisas em alguns aspectos, mas
não em todos. E isso está provado pelos nossos líderes atuais. Eles continuam
presos aos anos 40 ou algo assim.
Houve
algum acontecimento específico que fez com que você achasse que os anos 60 não
cumpririam suas promessas?
Suponho que preciso considerar o rompimento dos Beatles
como o momento mais sombrio. Os Beatles chegaram a um ponto em que implodiram -
todos tinham dinheiro e fama e, de vez em quando, era inevitável que nos
irritássemos uns com os outros.
Eu tinha conduzido a dança um pouco em Sgt. Pepper's.
Para mim, o título e a ideia toda foi inspirada pela época e pela fertilização
cruzada com os outros artistas. Queria que fosse algo do tipo "uau, cada
um de nós tem sua lista de heróis [na capa] e vamos assumir estes alter egos.
Seremos pessoas novas fazendo este disco, e podemos mais ou menos viver nestes
corpos novos e fazer um álbum como se fôssemos outra banda". Aquilo foi
libertador.
Mas, depois disso, não dava para sentir que era possível
seguir em frente como aquela outra banda. Você inevitavelmente voltava à terra,
fazia parte dos Beatles.
E
foi aí que os problemas começaram...
Foi quando começamos a discutir assuntos comerciais,
principalmente com o advento de Allen Klein - ou "um certo empresário
norte-americano", ou seja lá como somos obrigados a nos referir a ele.
Deixemos para o departamento jurídico resolver. As conversas passaram a ser
assim: "Ah, que merda, vamos ter mesmo que pensar sobre isso agora ou
perderemos tudo?". E isso causou um racha tremendo.
Você
acabou processando os outros Beatles.
Foi o pior momento da minha vida, quando me informaram
que não poderia me opor a esse tal de Klein, esse "suposto empresário
norte-americano". Como ele não era uma das partes de nenhum dos nossos
acordos, precisei brigar contra os outros três caras. Foi uma situação com a
qual me debati durante meses. Ou era "não, não brigue com esses caras e
perca tudo para todo o sempre" ou "brigue com esses caras e salve
tudo". Foi um dilema. No final, pensei "acho que eles não sabem o que
estão fazendo, estão cometendo um erro pavoroso".
Então eu, de fato, briguei no Tribunal Superior e venci,
por sorte.
Isso criou um estigma terrível para mim, como sabia que
criaria - não tinha entrado naquilo de bobo. Sabia qual seria o preço. Mas
achei que, no fim, as pessoas descobririam que tinha razão. E foi gratificante
quando todos os caras, no final, piscaram para mim e disseram: "Foi bom
você ter feito aquilo". Até Yoko [Ono] reconheceu isso. Mas foi uma coisa
horrorosa de se viver. Foi quando o sonho se desfez para mim.
Houve
um ponto em que você sentiu que, apesar da dissolução da banda, seria capaz de
seguir em frente e continuar a se divertir?
Fazer o álbum McCartney (1970) foi bom para mim nesse
aspecto, porque realmente retornei às raízes. Eu me senti bem, e isso é bom.
Até hoje, as pessoas reparam naquele álbum. Com freqüência acontece com os
artistas e os músicos - eu ia dizer especialmente, mas acho que está mais para
igualmente - de o trabalho ser aquilo que faz você se compreender.
A música é especialmente boa para isso, é uma boa
terapia. Estava passando pela coisa terrível de perder a amizade daqueles meus
camaradas da vida toda, e para quê? Bom, a mim parecia que o motivo era tentar
salvar a vida deles. Aliás, não existiria uma [gravadora] Apple para estar em
litígio com a Apple de Steve Jobs - e não existe mesmo, falando nisso, já foi
tudo resolvido -, mas não existiria uma Apple Records hoje. Tudo teria
desaparecido; a coisa toda simplesmente não existiria.
Não haveria nenhum show em Las Vegas, não haveria nenhuma
destas coisas que agora estão aí tão gloriosas se não tivesse tomado aquela
atitude. Mas foi uma decisão dura de verdade. Foi uma daquelas coisas que
exigem terapia depois, e para mim, voltar à música foi essa terapia. E, é
claro, com a enorme ajuda de Linda. Ela foi uma das grandes responsáveis por me
fazer voltar à vida e seguir em frente. Ela era um bastão de força naquele
momento. Isso e produzir música fizeram com que atravessasse aquele período.
Você,
George e Ringo puderam desfrutar os ressurgimentos dos Beatles. John, é claro,
morreu antes de boa parte disso acontecer e George também se foi.
Esta é a pior parte de ficar adulto. Você perde amigos, é
inevitável. Não é exatamente uma surpresa, mas é terrível. É muito triste.
Conhecia John intimamente há tanto tempo. Sempre me admiro com o fato de eu ter
sido o cara que se sentava com John para escrever todas aquelas coisas. Éramos
só ele e eu em uma sala e isso era bem especial. Então, perdê-lo foi horrível.
E foi especialmente triste porque tínhamos superado a
desavença dos Beatles. Apesar de ele estar morando em Nova York, nós
conversávamos com bastante regularidade. Simplesmente conversávamos sobre
coisas cotidianas - sobre o filho dele, Sean, e sobre a vida em geral, sobre os
pães que ele assava. Trocávamos receitas de pão, era ótimo. Então, simplesmente
foi uma tragédia horrível ele ter sido arrancado daquele jeito.
No caso de George, foi igualmente trágico. Eram meninos
tão lindos, sabe? [Ele faz uma pausa, e sua voz treme] George era simplesmente
um sujeito ótimo. Ele era um garotinho que eu conheci em Speke, Liverpool, só
um garotinho que entrou no meu ônibus. Eu subi no ponto anterior ao dele, ele
entrou e nós começamos a conversar sobre guitarras e rock'n'roll. Depois,
quando estávamos procurando um guitarrista, e eu mencionei o nome dele a John,
George se juntou ao grupo. E daí passou a ser apenas o sábio George. Ele era um
sujeito lindo que não aguentava gente burra. Era uma alma muito linda. Nem me
deixe começar, cara. É um horror ter perdido aqueles caras. Mas ser adulto é
uma verdade terrível.
Você
tem ideia do que continua a tocar as pessoas com os Beatles depois de todos
esses anos?
Acho que, basicamente, é a magia. Os Beatles eram mágicos.
Para mim, a vida é um campo de energia, um punhado de moléculas. E essas
moléculas específicas se formaram para que aqueles quatro caras virassem os
Beatles e fizessem todo aquele trabalho. Preciso pensar que foi algo
metafísico. Uma coisa que deve ser considerada mágica. Estou sendo muito
extravagante?
Se você quiser ser prático, acho que as músicas eram
muito bem estruturadas. Quando as canto atualmente em shows, penso "isso
aí é bom, é sim. Que verso bom. Ah, entendi!". É uma redescoberta. Você
simplesmente lembra "ah, foi por isso que fiz assim". Então, elas
também têm uma força física, é trabalho bem-feito.
Você teve papel importantíssimo depois dos ataques de 11
de setembro, organizando o Concerto para a Cidade de Nova York e ajudando a
reconstruir a confiança da cidade. Mas muita coisa aconteceu para complicar
nossa noção do que houve naquele dia. Quando você pensa em 11 de setembro hoje,
o que lhe vem à mente?
Bom, tenho minhas lembranças pessoais de estar no
[aeroporto de Nova York] JFK e de ver a fumaça das torres gêmeas. O aeroporto
fechou, nosso voo foi cancelado, fomos para Long Island, ouvimos o noticiário e
assistimos a TV. E depois pensei em fazer meu próprio concerto, mas tudo
culminou no Concerto para Nova York, que foi ótimo, porque muita gente queria
fazer alguma coisa.
Foi ótimo fazer parte daquilo - ajudar os
norte-americanos em particular, mas o mundo de maneira geral, a colocar seus
sentimentos em algum lugar. A oportunidade perdida foi que as pessoas ficaram
com um enorme sentimento de solidariedade em relação ao povo americano, e as
ações políticas que se seguiram a 11 de setembro desperdiçaram a oportunidade.
Foi como se alguém no playground tivesse apanhado, mas não sabia quem tinha
batido, e por isso resolveu descontar na pessoa mais próxima - e isso se
transformou no Iraque. A agenda política é a culpada.
Olhando
para a frente, quais são as principais questões que se colocam agora?
Fazer algum avanço em direção à paz mundial. Seria ótimo
se as pessoas com diferenças no mundo hoje percebessem que não existem
diferenças - é um campo de energia. Precisamos da mesma velha coisa de sempre:
paz e amor. Não sendo frívolo, mas esse continua sendo o grande objetivo. Bom,
e vocês aí precisam de um novo líder [risos]! Quer dizer, isso ajudaria.
Nem
brinque...
O ambiente é uma realidade. Algumas pessoas me dizem
"há tantas causas, não sei quais apoiar". Minas terrestres, os
maus-tratos com animais, só para mencionar duas pelas quais me interesso. É
como se considerassem este o problema: "Qual causa apoiar?". Eu
respondo: "Não entre em pânico, apenas escolha uma que o agrade e vá em
frente. Todas estão conectadas". Mas eu sou otimista, tem muita gente
bacana por aí. No momento, temos montículos de terra. E tudo bem. Isso é bom.
Mas precisamos que se transformem em uma montanha. Tem muita gente inteligente
por aí, mas, infelizmente, também tem um monte de imbecis. Mas o meu otimismo
me leva a torcer para que os inteligentes construam a montanha.
E
qual você gostaria que fosse seu legado pessoal?
Sempre que me perguntavam como eu gostaria de ser
lembrado, respondia "com um sorriso". Mas gostaria que as pessoas
entendessem o que eu fiz e pensassem que há uma enorme força naquilo. Gostaria
que as pessoas pensassem que uma parte daquilo chega a ser demoníaco de tão
forte. Isso me bastaria.
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