VeloSes & FurioZos


Ontem
Hoje
Duas motocicletas de no máximo 150 cilindradas faziam zigue zague entre os carros na mau caráter estrada Rio-Manilha. Na moto de trás, preta, um adesivo branco, bem grande, colado no tanque de gasolina: “Velosez e Furiozos”. Assim mesmo, com o S no lugar do Z, Z no lugar do S e muito cocô de pombo na cabeça do famigerado piloto. Silencioso cortado foi substituído por dois canos de descarga que apelidei de “esporrers”.

Um deles quase arrancou meu espelho retrovisor e o sujeito do carro da frente xingou os dois motoboys (ambas as motos carregavam aqueles baús gigantes e maltrapilhos para entregas na garupa), que faziam a tradicional “saudação” empinando o dedo médio da mão.

Depois vieram outros, e outros, lá na frente uma moto estava caída no acostamento e uma ambulância do Samu atendia o sujeito que parecia bem. Enfim, as motocicletas de hoje que arrotam pelas ruas conduzidas por bípedes que ostentam Q.I. de protozoários nada tem a ver com aquelas do passado. Românticas, pinta de cafajestes de baixos teores, imortalizadas por Marlon Brando, James Dean, Evel Knievel.

Assisti ao filme “Easy Rider”, de 1969 (no Brasil chamou-se “Sem Destino”) no final de 1970 num cinema chamado Alvorada, em Teresópolis, que deixava menores de idade entrar. O filme acabou se tornando um clássico do chamado “road movie” e todos nós, adolescentes, vibramos no cinema com aquela viagem de Wyatt e Billy (Dennis Hopper e Peter Fonda) ao som de Jimi Hendrix, Steppenwolf e muitos outros.

A fumaça de maconha, cigarro com Melhoral, cherinho da loló e similares era tal que disseram que o lanterninha do cinema começou a recitar Alziro Zarur, botou o piru pra fora e começou a escrever seu nome com urina na parede lateral da sala.

O tempo voou e mais recentemente, num delicioso voo entre o Rio e Porto Alegre, vi o anúncio de uma moto Harley Davidson numa revista. Lembrei de “Easy Rider” e constatei que o filme nada mais é do que a saga de dois vagabundos, dois à toas, traficantezinhos de nona categoria, que passavam a vida levando cocaína, heroína e similares do México para Los Angeles e sonhavam passar o carnaval em Nova Orleans.

Suas motos eram aqueles modelos “chifrudos”, Harley Davidson com o garfo longo que bota a roda da frente bem longe. Uma marca que acabou se tornando sonho de consumo de todos nós, apesar de sabermos que aquela moto é uma bosta, derruba qualquer um, trucida a coluna vertebral, não faz curva, não freia, bebe como uma porca, não leva garupa, enfim, moto de cinema.

O chamado “charme transviado do motociclista” acabou virando essa cloaca urbana que está aí. Flanelinhas trepados em estrumes sobre rodas arriscam não só as suas vidas mas as nossas, sobem e descem de calçadas, em geral andam de chinelo (tipo Ryder), bermudão de surfista do Planalto, boné com a aba virada para trás no lugar do capacete, sem camisa, óculos escuros espelhados modelo 4 por 30 reais, cabelo a la Neymar e “tocando o terror” como dizem para os amiguinhos no final do dia.

Esses são motoqueiros. Eu fui motociclista. Até mais ou menos 2005 e minha última moto foi uma Suzuki DR 800 que adorava. Vendi porque perdi o medo dela. E quando o sujeito perde o medo de moto é melhor vender senão vai se acabar. Isso é regra e não exceção.

Gostava de rodar sozinho por aí já que como não sei montar barraca e arrumar mochila nunca pertenci aos grupos de duas rodas que viajam pelo país. E pegaria mal todo mundo acampado e eu em pousada.

Depois de muitos e muitos anos condenando aquele clone de George Bush que matou os personagens de Hopper e Fonda no final de “Easy Rider”, hoje eu entendo. Quando esses animais quase matam velhos e crianças nas calçadas, se metem entre os carros (o problema não é só um desses morrer, mas o problema eterno que causa ao motorista), enfim, são representantes (mal) motorizados da molambalização que a cada ano engole mais o Brasil, dá vontade de dar umas bofetadas.

Bofetadas que a tecla SAP dos reacionários dos EUA traduz para “tiro de escopeta 12 nos cornos”.

Como aquele que matou Wyatt e Billy.





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