Sozinho não dá (2)


Sozinho não dá por um monte de motivos, a começar pelo Homem, que desde que era símio, é um bicho de bando. Por isso costumo dizer que trabalhar sozinho exige um esforço monumental.

Como sou freelancer, a maior parte do tempo fico sozinho diante do computador. Volta e meia dou uma saída, tomo um café na esquina, bato um papo, passo na banca de jornais (fundamental) e volto.

Já me habituei, mas o grande esforço é que num trabalho solitário não posso contar com opiniões, observações, críticas e elogios de ninguém. Sou eu e eu. E quando bate uma dúvida no caso de um texto, só me resta deixá-lo decantando para reler horas depois. Essa releitura, depois que perdemos o contato com o texto por horas, leva a muitas correções, realinhamentos, novas abordagens.

Não nego que sinto falta da redação de jornal, radio, TV, onde a minha geração não só compartilhava o trabalho mas também a vida, o cotidiano, opiniões eram trocadas e muitas vezes (muitas!) a conversa esticava num bar.

Quantas e quantas vezes enchemos mesas no Lamas, restaurante no Flamengo que era pista de pouso de jornalistas. Gargalhei muito naquelas mesas, ouvi e participei de discussões ferozes, volta e meia, tarde da madrugada, alguns mais alterados etilicamente iam partir para a pancadaria corporal na calçada mas a turma do deixa pra lá não deixava.

Dez anos atrás trabalhei numa redação onde somente eu e um outro colega éramos da mesma geração. Não senti sequer sinais de boemia, de esculacho, garotada politicamente correta que, em compensação, apurava mal, escrevia mal, não tinha ideia do que já aconteceu no país e no mundo porque não lia livros e (pasme!) nem jornais. Pois é, gerações de jornalistas que não leem jornais. Não vai aqui uma crítica, mas uma observação. Daí textos que revisei falando de “o trânsito segue parado” (valeu a lembrança, Romildo!) e outras calamidades.

Mas bem ou mal era uma redação e eles me tratavam como um igual. Mais: pediam opinião e quando eu dava um meio esporro, na base da suavidade, senti que eles agradeciam. Da mesma forma, eu pedia a opinião deles.

Trabalhando sozinho, quem vai me dar um meio esporro se determinado texto ou programa de rádio estiver caminhando pelo acostamento, correndo o risco de cair no abismo? Ninguém.

Também no trabalho, sozinho não dá.

Postagens mais visitadas