Submergir
As batalhas navais ensinam que diante do bombardeio os
submarinos submergem. Submergir é proteção. Para submarinos e para nós.
“Sai, sai do sereno menino”, diz a canção que alerta que
“sereno pode fazer mal”. Uma tradução urbana do ato de submergir. Se bem que
não sinto o sereno há muitos anos. Nem ele, nem a garoa, nem a neve de
Itatiaia.
Itatiaia foi onde passei um dos melhores fins de semana de
minha vida e o pior feriadão. “A vida é assim”, dizia Zora Yonara,
astróloga do rádio e sua voz enigmática com eco alertando: “pisciano, você tem
pela frente uma sequência de vitórias esplendorosas. Insista, pisciano!”.
A submersão é vital para a sobrevivência. Basta ter folego e
humildade. Castrar os ventos tortos da arrogância, deixar nossa nau existencial
largada no fundo do mar, ao lado dos polvos e peixes abissais.
Os tímidos vivem nos bancos de areia, cercados de corais.
Parados, prestando atenção nos praticantes de evasão de privacidade (essa é do
Tutty Vasquez) que exibem sua anêmica minúscula burguesia nas redes sociais do
gênero “estou tão feliz nessa foto, tão feliz que se me assoprar eu caio no chão
e choro”.
Ahhhh, o blefe das redes sociais. Ahhhh, o blefe das redes.
Ahhhh, o blefe das sociedades. Ahhh, o blefe crônico da humanidade.
Submergir faz bem a saúde. Mesmo quando o oponente lança
bombas de profundidade que fazem nosso casco mugir como o touro do Apocalipse.
Quem sabe submergir se esconde nas montanhas de pedra submarinas. Pouca luz, nenhum som, motores desligados. Esperar a tormenta passar. Um, 12, 30, 600 dias. Submarinos atômicos. Autonomia. Falo de nós, longa autonomia. Falo da sociedade, aguda dependência.
As batalhas navais ensinam que diante do bombardeio os
submarinos submergem e que as galinhas morrem por cacarejarem depois do ovo.
Não é o caso do bicho-preguiça e seu mutismo, espatifado até por skate.
Não fala, mas não corre.
Correr ou falar?
Opção?
Sem dúvida a terceira.
Submergir.
Ou: em dia de temporal de faca não se senta na janela.
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