Bolsonaro e filhos pensam e agem como um bloco - um estudo sobre a família do presidente - Por Ascânio Seleme – O Globo – 31-03-2019
Mais do que
doença, os Bolsonaro mantém um pacto inquebrantável.
Aqueles que ainda pensam ser possível separar o
presidente Jair Bolsonaro de seus filhos, mesmo que apenas na gestão do país, é
melhor ir logo tirando o cavalinho da chuva. Os Bolsonaro são um bloco único,
monolítico, inseparável e inquebrantável. Suas posições são resultado de um
pensamento único, elaborado ao longo de anos, e nenhum dos seus membros
sobrevive sem os demais, explica Dado Salem, economista, mestre em Psicologia
do Desenvolvimento e sócio da Psiconomia, empresa especializada em gerir
questões complexas e sensíveis envolvendo famílias e negócios.
Salem fez um estudo sobre a família do presidente
tomando por base entrevistas que cada um deu ao longo dos anos e suas
manifestações nas redes sociais. Com esses elementos e com o apoio de um
relatório contendo as nuvens de palavras mais repetidas por cada Bolsonaro no
Twitter, elaborado em 2016 pela cientista política Mariana Cartaxo, foi
possível escrutinar a raiz comum do raciocínio de Jair, Flávio, Carlos e
Eduardo.
Os Bolsonaro são o que Salem chama de “família
simbiótica indiferenciada”. Eles pensam, sentem e agem como um bloco. São
vulneráveis quando separados e se sentem ameaçados pelo mundo externo, o que os
torna ainda mais fechados. Têm tendência ao isolamento e possuem uma enorme
capacidade de deteriorar relações muito rapidamente. São governados por suas
reações emocionais ao ambiente e acabam gerando neles próprios uma previsível
ansiedade crônica.
Em famílias assim, o pai não toma qualquer decisão sem
ouvir os filhos. O que parece ser o caso de Bolsonaro. Seus filhos, por sua
vez, detestam os que se aproximam demais do pai, sobretudo se enxergam nessa
aproximação uma tentativa de manipular o patriarca. No caso da família em
questão, os filhos têm ciúmes dos que se aproximam para ganhar luz e aparecer
aos olhos do público. E torpedeiam sistematicamente o intruso.
Cada um dos filhos cumpre um papel no bloco. O Zero Um,
Flávio, o mais velho, é o conciliador e o diplomata, que busca interlocutores
para o grupo. “Normalmente é assim que funciona em famílias simbióticas, ao
primogênito é dada essa função”, diz Dado Salem. O problema na família
Bolsonaro é que Flávio acabou queimado logo na largada. O Zero Dois, Carlos, é
o queridinho, o mais ligado ao pai. Tão ligado que acaba confundindo seu
próprio papel, queria ser ele próprio o pai da família, o presidente da
República. O Zero Três é o “intelectual”, o formulador do bloco, e como tal é
respeitado pelos demais.
Nas famílias simbióticas indiferenciadas não existe
separação emocional entre seus membros. Eles não são bem desenvolvidos como
indivíduos. Sua reatividade emocional é intensa e pode ser disparada por
qualquer faísca. Essa característica explica a demissão do ministro Bebianno e
o mal-estar criado com o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia. Um elo
sustenta o outro, sempre. As relações externas normalmente geram angústia
e ansiedade em seus elementos. Para aliviar a tensão, essas famílias geralmente
tendem a ser ainda mais unidas e indissolúveis.
A leitura das nuvens de palavras produzidas a partir das
suas manifestações nas redes comprova a tese do ideário único. Mariana Cartaxo
apurou que as palavras que mais aparecem nos discursos de cada um dos membros
do clã são muito parecidas, e três são repetidas por todos os membros da
família: “Brasil”, “Contra” e “PSOL”. No caso de Flávio, que até o ano passado
era deputado estadual no Rio, a palavra “Polícia” também tem destaque.
Desnecessária qualquer explicação.
O resultado dessa simbiose, segundo Dado Salem, é o que
todo o Brasil já viu, as decisões de Jair Bolsonaro atendem prioritariamente ao
arranjo do grupo familiar. O presidente não governa sozinho, governa com seus
filhos. Os ministros e demais assessores compõem o ambiente, mas quem manda são
pai e filhos.
Um alerta: o Zero Quatro vem aí. Pesquisa de seu perfil
nas redes revela que Renan, 21 anos, estudante de Direito, está crescendo com a
mesma retórica, os mesmos slogans e os mesmos ranços dos irmãos e do pai. A
única coisa que os separa dos irmãos são as mães diferentes. Mas esse é um
detalhe que não significa muita coisa no universo absolutamente masculino dos
Bolsonaro. Por isso também a Zero Cinco, Laura, de 8 anos, jamais emergirá.
Comentários
Postar um comentário
Opinião não é palavrão. A sua é fundamental para este blog.
A Comunicação é uma via de mão dupla.