O grave alerta do oceanógrafo Jacques Cousteau que o mundo ignorou, há 50 anos

 

O Globo, 22 de setembro de 2020

"A vida submarina decresceu em cerca de 40% nos últimos cinqüenta anos. Mais de mil espécies foram extintas, e a destruição aumenta de ano para ano. Como conseqüência da contaminação das águas, os recifes de coral estão diminuindo, espécies inteiras da fauna aquática estão em vias de extinção e milhares de peixes morrem anualmente pela ingestão de substâncias ou objetos lançados ao mar".

As conclusões acima estão, hoje, consolidadas por uma série de estudos recentes que evidenciam os impactos nocivos da atividade humana sobre os mares do planeta. Mas a declaração é, na verdade, do famoso oceanógrafo e militar francês Jacques Yves Cousteau e foi publicada pelo GLOBO em setembro de 1970, há 50 anos. O oficial da marinha fez essas afirmações após voltar de uma viagem de estudos de três anos e meio. Naquela época, no diagnóstico do especialista, o homem já estava destruindo irremediavelmente a vida nos oceanos. A julgar pela situação atual dos nossos mares, ninguém acreditou nas previsões do cientista europeu.

 "A poluição é geral. Os homens não se dão conta de que as substâncias poluidoras vão parar no mar. E os elementos nocivos que os homens não levam ao mar são carregados pelas chuvas. A pesca em excesso ou não planejada também é uma forma de destruição. Os oceanos estão sendo dizimados. As ovas e as larvas estão desaparecendo. Em outras épocas, o mar se renovava, os ciclos de evolução se completavam, mas esse equilíbrio desapareceu com a industrialização", alertou o oficial da Marinha francesa, antes de completar. "Os oceanos estão moribundos, por culpa dos homens, e a espécie humana não pode sobreviver sem os oceanos".

 Autor de documentários sobre a vida marinha para o cinema, como "O mundo em silêncio", que lhe rendeu a Palma de Ouro no Festival de Cannes, em 1956, Custeau percorreu com sua equipe de mergulhadores mais de 250 mil quilômetros, investigando os ecossistemas aquáticos nos mares das Antilhas, no Mediterrâneo e nos oceanos Atlântico, Indico e Pacífico. A viagem, a bordo do navio de pesquisas Calypso, começou em Montecarlo, a 18 de fevereiro de 1967. Quando terminou o trabalho, o francês estava assustado com os impactos da humanidade nos mares.

Longe de ser um pessimista, a previsão do oceanógrafo vem se confirmando a cada novo estudo feito sobre os ecossistemas marinhos. Enquanto comunidades de corais do planeta sofrem os efeitos da ação humana, a quantidade de plástico nos oceanos está envenenando a fauna dos mares e a temperatura das águas sobe devido às mudanças climáticas. Em pouco tempo, dizem cientistas.

Além de pesquisador e ambientalista, Cousteau, que morreu em 1997, aos 87 anos, foi um grande inventor. Foi ele quem criou o aqualung, aparelho de mergulho autônomo, que deu muito mais liberdade aos mergulhadores, que antes dependiam dos pesados escafandros. Nos anos 80, o francês fez uma de suas maiores expedições no Brasil, ao explorar o Rio Amazonas, no esforço de entender como a atividade humana ao longo do curso d'água estava afetando a vida nos mares. Em 1992, ele esteve no Rio para a Conferência ECO-92 e, a partir de então, tornou-se consultor das Nações Unidas e do Banco Mundial.

"A guerra do futuro será entre os que defendem a natureza e os que a destroem. E a Amazônia vai ficar no olho do furacão. Cientistas, políticos e artistas desembarcarão aqui para ver o que está sendo feito com a floresta", disse o ambientalista por ocasião daquela incursão na selva brasileira, em mais uma previsão que se concretiza nos dias de hoje.

 


Comentários

Postagens mais visitadas