A culpa é do STF - Por Carlos Alberto Sardenberg, O Globo
Tomo emprestada a muito pertinente citação encontrada pelo
advogado, jurista e escritor José Paulo Cavalcanti Filho: “O órgão que mais
falhou à República não foi o Congresso; foi o Supremo Tribunal”. É de João
Mangabeira, em “Rui, o estadista da República”, de 1937.
“Tenho medo de que, olhando para trás, um dia façamos juízo
semelhante do Supremo de agora. Antes, pelo que não fez. Hoje, pelo que está
fazendo” — acrescenta Cavalcanti Filho, em texto que pode ser encontrado em
www.jp.com.br.
Pois o professor de Direito Constitucional Joaquim Falcão
provavelmente entende que o Supremo de hoje é até pior que o comentado por
Mangabeira. Depois de colocar as perguntas básicas acerca das últimas decisões
do STF — afinal, Lula cometeu algum crime ou agiu dentro dos preceitos legais?
—, Falcão arremata: “O Supremo não responde. Apenas constrói respostas
reflexas. Não entra no mérito. Oculta-se em debates processuais sobre
competências internas. Adia o Brasil. Nossa economia. Os investimentos. Nossa
democracia. A normalização política”. (“O Estado de S.Paulo”, 23/04/21).
Mas, além de se esconder em firulas processuais (como já
comentamos aqui), alguns ministros do STF, quando entram no conteúdo,
apresentam teses estapafúrdias.
Ricardo Lewandowski, por exemplo. Para condenar a Lava-Jato,
disse que a operação trouxe enormes prejuízos ao PIB, algo como uma perda em
torno de R$ 150 bilhões, soma muito maior que o dinheiro recuperado pela
força-tarefa.
De onde viria aquela perda? Do fechamento e/ou diminuição
drástica das atividades de grandes empresas e empreiteiras. E mesmo na redução
dos investimentos da própria Petrobras e do BNDES.
Mas não estavam todas envolvidas num enorme sistema de
corrupção? Corrupção provada, demonstrada, confessada, sendo encontrado o
produto do roubo nos caixas de partidos, empresas, partidos e seus chefes.
Portanto, a conta é outra. Quanto o país perdeu com as obras
superfaturadas? Quanto a Petrobras terá perdido com os investimentos também
superfaturados feitos em plataformas e refinarias projetadas apenas para abrir
espaço para a corrupção?
Lewandowski simplesmente contou de outro modo a velha
política do “rouba mas faz”, docemente aceita no século passado.
Até o mensalão, nenhum político ou grande empresário havia
sido condenado por corrupção. Ainda nesse julgamento, advogados do primeiro
escalão diziam: “Não se trata de corrupção, nem lavagem de dinheiro, é apenas
caixa dois”.
Como se dissessem: “Qual é? Sempre foi assim”.
O mensalão abriu caminho para a Lava-Jato — força-tarefa que
utilizou dos mais modernos métodos de combate à corrupção, recomendados e
elogiados pela OCDE, introduzindo uma nova concepção do Direito Processual e
Penal.
Durante seis anos, as operações de Curitiba e do Rio
descobriram um monstruoso sistema que ligava empresas a partidos e aos
governos.
Até que a velha política dá a volta por cima e, como disse o
ministro Luís Roberto Barroso, agora quer vingança. Quer colocar na cadeia o
ex-juiz Moro e o procurador Deltan Dallagnol.
Como não conseguem esconder que houve corrupção, ministros do
STF inventam essa história de que o combate à roubalheira foi prejudicial ao
país. É o contrário. Quantos investimentos deixaram de ser feitos por aqui
porque só eram viáveis se os investidores entrassem na regra do jogo sujo?
Essa insegurança jurídica aparece inteiramente nas últimas
decisões do Supremo. Não se sabe quem julga o que e onde. Conforme o réu e o
momento, pode ser aqui ou ali. Conforme o juiz, o processo anda ou morre nas
gavetas.
De certo, é a volta dos que pareciam ter ido. Lembram-se do
Romero Jucá? Aquele que foi grampeado por um colega quando dizia, a propósito
da Lava- Jato: precisa estancar essa sangria. Então, vai trabalhar como
assessor na CPI da Covid, a ser relatada por Renan Calheiros.
Comentários
Postar um comentário
Opinião não é palavrão. A sua é fundamental para este blog.
A Comunicação é uma via de mão dupla.