Esperança & Expectativa
Um abismo profundo separa o significado prático e
filosófico de esperança e expectativa. Recentemente, Lobão levantou essa lebre
num show. Começou a falar sobre o significado (e as significantes) das
duas expressões, mas a falta de educação da ruidosa e irritante plateia não
deixou o lobo uivar até o final do raciocínio.
Esperança é o possível, expectativa é o ideal, que não
existe. Felizmente mantenho um pacto com a esperança desde a hora em que nasci.
Com a expectativa, não. Relação zero.
A expectativa é parente próxima da ansiedade, da
correria, da falta de ar, faz nossos pés molharem em Manaus quando ainda está
chovendo em Porto Alegre. Já a esperança é centrada, amena, racional. A
esperança faz projetos, enquanto a expectativa cisma.
Não corro, não fujo, parto para cima com todas as forças
disponíveis e depois, atento, aguardo a hora da colheita deixando o destino
trabalhar. Pilhar o tempo todo, insistir, forçar a barra, chutar portas, em
geral levam ao desespero sob o manto da expectativa. Em todos os setores da
vida.
Há milhares de anos, os asiáticos costumam escrever que o
silêncio é uma forma de comunicação. Pode até ser, mas não sou asiático, sou
latino. Logo, não comunicou nada disse. Quando os sinais não veem (ou vão e não
voltam), nada aconteceu. A esperança ensina que se não há declaração de amor ou
declaração de guerra, não existe uma coisa nem outra. Cínica, a expectativa
insiste que nem sempre os sentimentos emitem sinais. Como mente essa senhora,
que eventualmente se traveste de tola.
Desde o dia em que Lobão tentou falar sobre expectativa e
esperança no tal show, mas acabou atrapalhado por galinhas, codornas e
barangas da plateia, o tema ficou perambulando por mim. O que acabou me
levando ao passado, a uma longa tarde que passei na casa do Lobo quando ele
morava no alto da Estrada das Canoas, em São Conrado, Rio.
Falamos muito sobre o flagelo da culpa. Culpa, ela mesma, a canalha que não nos
deixa olhar no espelho mesmo quando somos totalmente inocentes.
Gerar expectativas leva a culpa. Falar de esperança, não.
A expectativa é volátil, enganadora e induz suas vítimas a impregnar
a humanidade de promessas enquanto prepara uma desculpa para se livrar da
situação. A esperança resolve, a expectativa tenta se livrar. Esperança leva a
reflexão, a expectativa traz a insônia. Esperança não teme o início, o fim, o
meio.
A escolha é nossa.