O concerto de Colônia
O disco instrumental que me deixou de joelhos na primeira vez
que ouvi chama-se “The Köln Concert”, de Keith Jarrett, gravado no Opera House
em Colônia, Alemanha, em 24 de janeiro de 1975. Ou seja, o concerto que virou
disco (lançado em setembro de 1975) acachapante fez 44 anos este mês.
Não conhecia bem Keith Jarrett. Só em 1981 ouvi “The Köln
Concert” e foi como se um tufão rompesse os meus rochedos. Todos eles. Era um
LP duplo, importado (gravadora ECM, da Alemanha) que ouvi um dia inteiro em
casa e numa cópia em fitinha K7 que fiz, a bordo de meu Fiat 147. O álbum
vendeu quase quatro milhões de cópias e é o disco de piano-solo mais
comercializado na história da música.
Até hoje esse disco me vela para onde ainda não fui, mas irei.
A solidão do piano de Jarrett; músico
vidrado, tomado, a ponto de gritar várias vezes ao longo do concerto é algo que
não vai acontecer de novo. Por mais que seja desejado, planejado, ensaiado,
“The Köln Concert” é um raio que não vai cair mais uma vez e lugar nenhum. Nem
que Keith Jarrett queira.
A música arrasta os gênios. Jarrett se deixou abandonar
naquela noite de 24 de janeiro de 1975 em Colônia, sem medir consequências. Li
que a gravação do disco foi marcada por algumas confusões, pianos trocados, mas
virou uma obra, tão profunda, visceral, fundamental que ganhou o reconhecimento
mundial. Um disco que está muito à frente de 1975, de 2019, do ano 3000, porque
flagra a essência da liberdade, um momento muito raro em todos nós.
Anos depois, eu iria participar de uma entrevista coletiva de
Keith Jarrett no Rio que acabou sendo cancelada. Tinha (e tenho) muita vontade
de falar sobre “The Köln Concert”, mas, como todo mundo sabe, o músico era
encrenqueiro, daqueles que interrompem o concerto por causa do zumbido de uma
abelha. Hoje ele não é mais assim. Mesmo que a entrevista acontecesse, não
daria para conversar sobre aquela distante noite de Colônia.
Se a entrevista tivesse acontecido eu não ia para falar
do repertório/agenda de Jarrett naquele dia/semana/mês, e sim de Colônia, Alemanha, 24 de
janeiro de 1975 por uma única razão: eu queria estar lá. Queria muito.
Mas o poder do músico fez Colônia vir até mim (e a milhares
de outros brasileiros) dentro deste álbum duplo de vinil, que guardei até 80 e
tal. Depois comprei em CD que ouço neste exato momento, com os olhos ardendo, a
garganta levemente seca, porque é assim que a música determina que eu deva me
emocionar. E a música pode tudo. Inclusive parir a abstração profunda e genial,
para sempre genial de “The Koln Concert”, de Keith Jarrett.
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