Bossa
João Gilberto, Rio 1960
Minha conexão com a bossa nova se deu em dois momentos: na
infância, toda vez que a família vinha de Angra para Niterói (passava pelo Rio)
de carro meu pai aumentava o volume do rádio. Tocava muita bossa nova na Rádio
Jornal do Brasil, que ele ouvia sempre.
Ao som de bossa nova, digo, Bossa Nova (merece maiúsculas) o
carro descia a Via Dutra, entrava na avenida Brasil e passava em frente a uma
área enorme cheia de caminhões e máquinas, onde um gigantesco outdoor informava:
“Aqui, a futura sede do Jornal do Brasil”. A logomarca do JB era um elefantinho.
As notícias da Rádio JB (que como o jornal, funcionava na
avenida Rio Branco, 110) brotavam no alto falante do carro, seguidas de ótima
música, em especial Bossa Nova. Foram registros muito fortes que só fui
perceber muito mais tarde.
O Jornal do Brasil mudou-se para a avenida Brasil, 500, em
1972. Comecei a trabalhar lá, como repórter da Rádio JB AM, em 1974. Toda vez que entrava no prédio, olhava
para o ponto da avenida Brasil onde, pequeno, avistava o tal outdoor nos tempos
de Angra-Rio, e “ouvia” Bossa Nova. Começar a trabalhar no edifício do
elefantinho foi a realização de um sonho, por sinal, o sonho e todo jornalista
naquele tempo. A história impressionante do Jornal do Brasil foi contada por
Cezar Motta no livro “Até e última página – uma história do Jornal do Brasil”; conheça
aqui https://bit.ly/2XxCZ9s . A querida Belisa
Ribeiro escreveu “Jornal do Brasil: História e memória”, detalhes aqui: https://bit.ly/2JixmIg .
A Bossa Nova voltou a me seduzir na segunda metade da década
de 1980 graças ao convívio com o amigo e mestre Roberto Menescal. Ele era
diretor artístico da gravadora Polygram e foi numa tarde chuvosa que, almoçando no
Tarantella com ele, comentei que gostaria de fazer uma incursão profissional
na Bossa, quem sabe produzindo alguns artistas novos, etc. “Não quero ficar
estigmatizado como roqueiro”, eu disse.
O sábio Menescal deu um sorriso engraçado e disse “as pessoas
me olham e só pensam na Bossa Nova e no “Barquinho” (https://bit.ly/2RZkKsq), não tem jeito. Comecei
a curtir. Por isso, curta o rock. Curta muito esse estigma”. Nunca mais pensei
no assunto, mas comecei mesmo a ouvir Bossa Nova com direito a livro de Ruy
Castro na cabeceira.
Menescal é um dos pioneiros da Bossa Nova e, claro, conviveu
muito com o João Gilberto, um músico que para mim é um grande enigma. Provavelmente
por ignorância, não entendi – ou atingi – a sua propalada genialidade, não compreendi
a sua maneira de cantar, como absorvi, por exemplo, a música eletroacústica de Karlheinz
Stockhausen. Mas ele inventou a Bossa Nova e isso é mais do que suficiente. Não
sou tosco. Muita gente achava graça de suas excentricidades, parar shows porque
o ar condicionava incomodava, etc.
Sempre achei uma chatice isso. Dele e de
outro gigante, Keith Jarrett, que tinha mania de interromper concertos no meio
porque alguém espirrava na plateia. Jarrett parou com isso nos anos 1990.
Eu queria escrever alguma coisa sobre o João Gilberto, um
homem cultuado e admirado em todos os continentes, que representa um enorme
salto cultural do Brasil, a partir do final dos anos 1950. Por isso, escrevo
para desejar a ele Paz e Sossego, ao lado de Deus.
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