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Mostrando postagens de setembro, 2018

O filme acabou

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Contam os tiranossauros que até uns 20 anos atrás existiu um bípede mamífero, que também já virou petróleo, chamado lanterninha. Ele habitava as salas de cinema, com uma lanterna na mão, fiscalizando e chamando a atenção de quem não andava na linha, jogava galinha viva para o alto, copulava animadamente entre as fileiras de cadeiras ou conseguia penetrar na sala escura arrombando a porta de saída. O  lanterninha  era um guarda noturno da noite virtual das salas de cinema e foi extinto pelo competente e sempre alerta, obediente, positivo operante autopoliciamento imposto pela sociedade dita contemporânea e suas várias patrulhas espalhadas por aí. O rico portifólio de lendas urbanas cariocas (queimaram esse portifólio? Por onde anda?) conta uma célebre história que muitos juram que teve como palco a sala escura do cinema Comodoro, na Tijuca. Andei frequentando meio que compulsoriamente o Comodoro por duas razões: namorei uma tijucana na adolescência que, linda e intelige...

Sopa de cabeça de bode

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Não adianta, minha amiga. Não é para entender o título que os Stones deram ao álbum lançado em agosto de 1973. “ Goats Head Soup ”, que nada mais é do que Sopa de cabeça de bode. Ia escrever sobre “'Tropicalinha, Caetano e Gil para Crianças” de Pedro Henrique Lopes com direção de Diego Morais, um musical que adoraria levar minhas filhas e filhos, mas como não os tenho dá vontade de pegar uma criança emprestada para me acompanhar. Estou muito a fim de ver. Mas a minha timidez não permite que eu entre num teatro sozinho para assistir a um musical para crianças. Mas pelo que li, é bom. Sinopse: Tropicalinha mostra como a amizade e parceria profissional entre dois músicos deram origem à criação de um movimento cultural que influenciou e influencia até hoje as mais diversas manifestações artísticas. Em cena, o Reino de Pindorama, governado por uma rainha autoritária que toma o poder e baixa decretos proibindo a música e as cores no lugar. Dois amigos, Cae e Gil, se unem par...

Grades invisíveis (?)

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Estou relendo “O Homem e seus Símbolos” (1875-1961), clássico do psicanalista Carl Gustav Jung, que aborda em profundidade a questão dos arquétipos, delírios, possibilidades, barreiras existenciais, o poder esclarecedor dos sonhos. Jung rompeu com seu mentor, Freud, que via no sexo a causa (direta ou indireta) de todas a neuroses. Jung não concordava, tinha uma visão mais voltada para o trabalho do inconsciente, onírica, etc. Mas, posso falar? Leigo que sou, desde a adolescência usuário de psicanálise de várias escolas, sempre achei que neste quesito Freud tinha razão. O sexo é a essência da vida. Ponto.  Dele depende, inclusive, a sobrevivência do amor. Ponto. O maior feirão de fantasias da história da civilização está a poucos centímetros de pelo menos quatro bilhões de pessoas que acessam a internet. Ofertas, propostas, convites, tentações. Por outro lado, o medo, o travamento do politicamente correto, os regulamentos, a castração e, em oposição, a obsessão de querer r...

Lunáticos sociais

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                                                     Jean-Michel Basquiat Perdeu, Baby Esquecem que a verdade está longe, muito longe de ser absoluta. Atribuição divina, o absolutismo é incorporado pela patética e patológica onipotência dos lunáticos sociais e sua logorreia torpe, vulgo  brain damage .  Perdeu, baby. Lunáticos sociais não acreditam que aqui se faz, aqui se paga. Acham que é verborragia de adesivos de nona categoria. Mas o pior, o fatal, é o desprezo a máxima que sentencia: aqui não se faz, mas aqui se paga, sim. Perdeu, baby. Esquecem que o limite do egocentrismo é uma muralha de chumbo, conhecida na vala incomum como perda total. Essa malta, a dos lunáticos sociais, cruza a existência jogando gente no esgoto, arrotando as tais verdades absolutas inexistentes, como se o E.T. de Varginha fosse a incorporação do ...

Bananas ao vento

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As notícias golfam do computador como tempestade de bigornas, foices, ferro de passar a carvão. É só pancada, baixo astral, coisa ruim, mas filosoficamente pensando no banheiro, fazendo barba de manhãzinha, lembro que até a anta do juízo final sabe que notícia ruim sempre frequentou o cardápio principal da família brasileira. Explica, mas não justifica. Sabemos disso. Fazer o que? A primavera começa sábado. É uma estação meio dissimulada, não assume que é escrava do verão apesar das altas temperaturas, do asfalto mole. Mas, compensando, os shortinhos enfiados ganham as ruas mas só os invisíveis podem contemplar para não serem denunciados por assédio. Mais: por do sol deslumbrante, onibus apinhados com gente na capota, arrastões, brisa noturna nas areias desertas, pequenos impérios do coitus ininterruptos, como resumiu o baiano pai da tropicália quando cantou “Um poeta desfolha a bandeira/E eu me sinto melhor colorido/ Pego um jato, viajo, arrebento/Com o roteiro do sexto senti...

Cena de Cinema

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Lembro tão bem que sinto um nó na garganta. Depois de dois dias esperando uma ligação telefônica que não veio, fui ao cinema assistir “O Resgate do Soldado Ryan”, de Steven Spielberg. História real. Ao desembarcar na Normandia, no dia 6 de junho de 1944, o capitão Miller (Tom Hanks) recebeu a missão de comandar um grupo para o resgate do soldado James Ryan, o caçula de quatro irmãos; três haviam morrido em combate. Ryan estava dentro das linhas inimigas. A medida em que o filme foi desfilando na telona comecei a me identificar muito com o capitão Miller e lá pelas tantas, no auge da história, o nó na garganta se tornou choro compulsivo, que consegui disfarçar bem. Eu acho. Quando o capitão Miller, já em agonia, disse para Ryan “faça por merecer!” (quem assistiu o filme sabe o peso dessa frase) meus olhos estavam desfocados de tantas lágrimas. Era 1999. Vi o capitão Miller em mim e me vi no capitão Miller.  O Cinema, a Literatura, a arte em geral tem esse poder, essa...

Liberdade: calça de veludo ou lorto de fora

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                                                      Em novembro de 1937 os militares de Getúlio                                                       Vargas incendiaram 1.694 livros de Jorge Amado numa                                                                                    praça proxima ao elevador Lacerda, em Salvador. Mais cedo caminhava pela Gávea, olhei para o céu, para o sul e nem sinal de chuva. Foi quando lembrei que o famigerado Estado Novo do ditador Getúlio Vargas proibia a divulgação de...

Classe mídia

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Italo Campofiorito                                                                    Citroen 2 cv O amigo Ítalo Campofiorito, giga-intelectual (o mais visceral que conheço), tem um Fusca 1982 na garagem de seu prédio no Leblon. Ele me disse uma vez que o melhor carro do mundo é o táxi novo, com ar condicionado. Concordei. Quando vivia em Paris, anos 1970, ele tinha um Citroen 2 cv, xodó dos existencialistas; Jean Paul Sartre teve um, que acabou dando de presente para uma amásia. Depois, Ítalo comprou um Renault Alpine, mas preservou o 2 cv até voltar para o Brasil. Foi esse meu lebloniano amigo quem me apresentou a Oscar Niemeyer, início dos anos 90, numa célebre tarde em que o mestre da arquitetura decidiu almoçar num restaurante no Flamengo, Rio. Depois do almoço, tive o privilégio de levar meu amigo e O...

Varal de perversões inconscientes

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Estava numa sala de espera lendo um artigo numa revista quase científica (placebo?) sobre a ansiedade, que segundo a publicação, "é um dos grandes males deste século XXI". Foi promovida. Até pouco tempo ansiedade era o mal do século. Daqui a 10 anos, dizem as revistas científicas puro sangue, o mal maior será a obesidade. Entre os fatores que aumentam o estado descabelado do indivíduo está a preocupação. A palavra diz tudo: pré-ocupação. Sofrer por antecipação aumenta as dimensões dos problemas e ainda inventa novos ingredientes transformando o imaginário num caos. Um filminho onde reina a tragédia, o fracasso e outras percepções negativas que estão penduradas nesse varal de perversões inconscientes. Uma piada que exemplifica bem é a do motorista da van. Ele dirigia calmamente numa noite deserta, transportando 15 freiras que voltavam de um colóquio e de repente um pneu furou. Encostou a van e verificou que o estepe também está furado. Desespero. Sozinho, no es...

O homem que entrou de sunga na igrejinha da empáfia

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Laurentino Gomes é um escritor best seller que está já atingiu a marca de um milhão e meio de livros vendidos. Não pratica literatura janota, empolada, de aglomerado que imita jacarandá. Muito menos provinciana que chamo de texto calça de tergal . Não fala difícil e nem usa fantasias inventadas pela cronicamente decadente aristocracia que baixou no Brasil quando a corte portuguesa fugiu de Napoleão (milhares de pessoas) e veio se esconder no Rio. Laurentino Gomes é jornalista e historiador, e seu livro campeão de vendas chamado “1808” trata dessa vexatória fuga da corte e o impacto da chegada da por aqui. Em tempo, no livro lançado em 2007 e depois relançado numa nova edição de 2014, Laurentino já esculacha o estado do Museu Nacional, tipo “hoje abandonado, entregue as traças”. É quando ele aborda e dia a dia do vadio D. João VI no palácio que virou museu. Sob o título do livro, a frase : “Como uma rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta enganaram Napoleão e muda...

Mundo cão

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Na boa, meu cotidiano não interessa a ninguém, mas algumas vivências quase bizarras devem despertar, no mínimo, a curiosidade de alguém. Mesmo porque, falando francamente, a minha biografia é tão inusitada que já me convidaram para coloca-la em livro. Eu ri e jamais levei a sério. Deve ter sido piada. Sou jornalista há muito tempo, comecei com 16 anos em um jornal popular e de cara quase desisti quando um de meus chefes me mandou fazer uma reportagem tipicamente mundo cão. Puro sangue, desgraça, tragédia. Foi o caso de uma mulher enciumada, pilhada por uma vizinha fofoqueira, na Baixada Fluminense. A vizinha contou que o marido da mulher a estava traindo. Tomada pela insanidade, a mulher entrou em casa e viu o marido dormindo na sala. Aproveitou, pegou um facão e decepou o pênis do homem, tacou fogo e jogou no telhado. Um gato comeu um pedaço do que restou. Me mandaram fazer a matéria no local. Foi quando peguei um ônibus, a barca e voltei para casa. Fazer obituário de trol...

23 de setembro de 2017

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                                                                 "Mary" e o amor incondicional 23 de setembro de 2017 O ônibus estava parado em São Domingos, bairro de Niterói. Depois de dias e mais dias de ansiedade antecipatória eu ia assistir The Who pela primeira vez na vida e, sinceramente, ainda não estava acreditando que finalmente iria, em tese, dividir o mesmo espaço com Pete Townshend e Roger Daltrey. Minha ansiedade era de fã. Fã garoto, de 13 anos, que ouviu The Who pela primeira vez e levou a letra de “I can see for miles” para a professora de inglês, por favor, traduzir. Ela traduziu e quando li imediatamente pensei que “esse cara escreve para mim”.   Esse cara é Pete Townshend, líder do Who, compositor, poeta, ensaísta, escritor, guitarrista, pianista, produtor que a partir daquela tradução...