Fogo no rabo
No Brasil só existem duas estações: quente e muito quente.
Eventualmente, no inverno, dá uma esfriada, o cheiro de naftalina dos casacos
ganha as ruas, mas é muito breve e rápido. Mas nosso carma é com o suor e ar
condicionado e não com lareiras e cachecóis.
Todo mundo reclama do calor, mas o verão é adorado. Sempre
foi. Até esse, quando as temperaturas
passaram de 40 graus e os meios de comunicação importaram dos Estados Unidos
uma quenga chamada sensação térmica. Esse ano a marafona registrou mais de 50
graus algumas vezes.
Verão tem a seu favor algumas datas cruciais: Natal, Ano Novo
e Carnaval. Por isso inventaram a lenda de que o país entra em férias em
dezembro e só volta a trabalhar na segunda-feira depois da quarta de cinzas.
Mentira. Quer dizer (olha a elegância, rapá!), não é verdade. Brasileiro
trabalha pra cacete. Em alguns países europeus como a Espanha, há 30% mais
feriados (fora o ronco diário depois do almoço) do que aqui.
Verão é aeroporto de mitos. No topo da lista as praias do
Rio. Durante séculos cariocas sacanearam paulistanos por causa de praias que,
diziam, nós temos e os paulistanos não. Ouso informar que praia no verão
carioca é virtual. Superlotadas, tomadas de
flanelinhas, arrastões, camada de ozônio furada, cachorros fazendo coco na areia, poucos são loucos de se aventurar a um mergulho em Ipanema,
Leblon ou na eterna Princesinha do Mar, minha amada Copacabana e seu amásio
inseparável, o Leme.
Milhões se deslocam de todos
os pontos do Rio e periferia rumo as praias. Estimulados pela propaganda maciça
de cerveja na internet, TV, jornais, rádios, revistas, enchem a cara. Muitos
brigam. Mal intencionados fazem arrastões e num domingo apenas 20% conseguem
curtir a chamada “praiana” sem se aporrinhar.
Em suma, na boa, sem provocações, os paulistanos são
veranistas mais felizes porque, na certeza de que não tem praias, inventaram
piscinas, vão as represas, partem para dentro dos cinemas. É hora da revanche.
Quem já passou fim de semana em São Paulo (capital) sabe do que falo. Passei
vários e o que mais fiz foi me divertir, relaxar, ir a dezenas e dezenas de
piscinas, cinemas, parques.
Em 2012, o verão foi palco de um horror na região
serrana do Estado do Rio. Aos que dizem que “aquilo já era esperado por causa
da profusão de favelas”, peço um humilde peraí. Conheço a fundo a Serra dos
Órgãos e, até recentemente subindo para Teresópolis ainda dava para ver dezenas
de barreiras que formavam línguas de barro em áreas de vegetação nativa. Mas, é
claro que a favelização (de ricos também) das encostas agravou mais.
Fora isso, o péssimo hábito de construir em beira de
riachinho romântico, saído de historinha tipo Alice no País das Maravilhas, que
quando bate um toró de verão vira rio asfixiado que sai do leito detonando tudo
e todos pela frente.
Como em todo verão, meus colegas de grosso
calibre saem de férias. Sites, jornais e revistas infestados de
interinos e, pior, juristas, o que irrita muita gente. É no verão que as concessionárias de
luz gozam com as contas astronômicas (des) graças a roubalheira planaltina
e o uso de ar condicionado.
Cheguei a entrevistar um engenheiro que garantiu que quanto
mais novo é o aparelho menos luz ele consome. Só que é no verão que o
desgoverno autoriza os aumentos de tarifas e nós, talvez por estarmos trôpegos
de calor, nada fazemos. A última manifestação saudável de protesto contra a má
qualidade de serviços foi em Piratininga, Niterói, anos 90. Consumidores
apedrejaram uma subestação de energia.
E que surja um novo Albert Camus para escrever mais um
“Núpcias, o Verão”, que releio ano sim, ano não. E você, nunca leu? Corra e
compre.
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