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Mostrando postagens de dezembro, 2019

Parágrafo único

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Encerra-se à força o ignóbil escárnio da distopia e de suas amásias próximas. Finda-se à bala a suruba da hediondez, escrotidão amontoada, lamaçal de bílis expelida como se sêmen fosse. Cerra-se a faca os portais da inimaginação, * infeliz moribunda/A vida lhe esvai,/Corre arredia,/ Indômita,/ A cavalgar no alazão do tempo,/ Sem rédeas, sem rumo, sem direção... E a poesia,/ Por covardia/ Faz companhia,/ Num vagar vadio,/ Sem rima, sem graça, sem inspiração.../. Acede à força o gozo do amor clandestino incondicional, degolando o tergal do onanismo desardido . Há de arder. Há de arder para todo e sempre /; apertar, inchar, tocar, dedilhar, vibrar, brandir, estremecer. Enforque-se em público lupanar o desalento e o fatalismo. Abra-se o mundo dos sóis orgásticos, faça-se felicidade eterna o grito esfuziante do cabaço dizimado, felícia dos prazeres. ** Aqui/ onde foi abolido o hímen/ úmido hífen/ Aqui/ onde a língua é dinâmica/ e dedos são talheres/ Aqui/ onde o grelo/ destrona o falo...

A névoa da guerra: Walter Bosshard, Robert Capa e o conflito sino-japonês. Por Joaquim Toledo Jr*.- Zum, revista de fotografia

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“Robert Capa, um dos raros mestres da novíssima arte da reportagem fotográfica, cujas fotos da guerra civil espanhola foram um dos principais furos do ano, está agora na China, fotografando outra grande guerra para a Life”, anunciava a edição de 16 de maio de 1938 da revista norte-americana. Ao contrário das imagens do conflito na Espanha, as fotos enviadas por Capa da cidade de Hankou — a “Chicago chinesa” e então centro militar do país, explicavam as legendas — não mostravam “morte e destruição”, mas a euforia pela primeira vitória militar do generalíssimo (comandante supremo das Forças Armadas) Chiang Kai-shek desde a declaração de guerra ao Japão em 1937, seis anos após a ocupação da Manchúria pelos japoneses em 1931.                                                A foto da capa, hoje icônica, mostra um jovem soldado chinês em posição de atenção, o r...

A incrível ressurreição do The Who - por Diego A. Manrique - El País, Madri

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Houve um tempo em que o The Who era sinônimo de rock. Rock visceral e instruído. Sua curva de aprendizado foi surpreendente: o quarteto dominou rapidamente a arte de criar singles fascinantes até se fimar no formato do LP, às vezes duplo e com vocação narrativa (o que foi chamado, grosso modo, de “ópera rock”). Seu líder e compositor, Pete Townshend, revelou-se um comentarista erudito da teoria e prática da música popular; abandonou o arrogante “espero morrer antes de ficar velho” para fugir do tópico do rock como música juvenil. E tudo isso enquanto a banda mantinha a força avassaladora de seus shows. The Who saiu de seu estado de graça de uma forma ruim, entre escândalos, broncas, tragédias. Sua seção rítmica foi se desintegrando, com as mortes repentinas do baterista Keith Moon e, 24 anos depois, do baixista John Entwistle. No final de 1979, 11 de seus fãs morreram durante uma correria na entrada de um show em Cincinnati.  Townshend, desencantado e mergulhado em ...

A Terra é plana, astronauta ministro?

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O tenente coronel da reserva da FAB, Marcos Pontes, foi o primeiro e único brasileiro a ir para o espaço. Literalmente. Em março de 2006, como astronauta, ele ficou 10 dias na Estação Espacial Internacional, ou seja, dava uma volta em torno da Terra a cada 90 minutos. O líder do movimento pelo imbecilato nacional, um esquisitão e aparentemente vadio chamado Olavo de Carvalho, espalhou que dizem por aí que que a Terra é plana. Grosseiramente explicando, digo eu, como uma gigantesca mesa de pingue pongue que gira, gira, gira em velocidade alucinante e se torna redonda. Entendeu? O astronauta virou ministro da Ciência e Tecnologia e, em janeiro, disse à Rádio Bandnews FM que “sinto um nó no estômago quando leio ou ouço que a Terra é plana. Isso é uma consequência dos problemas da educação no país em todos os níveis.” Em julho, ao jornal O Dia, respondeu que “isso é uma bobagem. É igual falar que água não é água. Existem muitas provas necessárias sobre a forma da Terra e de outr...

Nautilus

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As batalhas navais ensinam que diante do bombardeio os submarinos submergem. Submergir é proteção. “Sai, sai do sereno menino”, diz a canção que alerta que “sereno pode fazer mal”. Uma tradução urbana do ato de submergir. Se bem que não sinto o sereno há muitos anos. Nem ele, nem a garoa, nem a neve de Itatiaia. Itatiaia foi onde passei um dos melhores fins de semana de minha vida e a pior Semana Santa. “A vida é assim”, dizia Zora Yonara, astróloga do rádio e sua voz enigmática com eco que alertou por décadas: “você tem pela frente uma sequência de vitórias esplendorosas. Insista!”. A submersão é vital para a sobrevida. Basta ter ar suficiente e muita humildade. Castrar os ventos tortos da arrogância, deixar nossa nau existencial largada no fundo do mar, ao lado dos polvos e dos peixes abissais. Os tímidos vivem nos bancos de areia, cercados de corais. Parados, prestando atenção nos praticantes de evasão de privacidade (essa é do Tutty Vasquez) que exibem sua anêmica e minúscula burg...

Desamor à cultura, por Ascânio Seleme – O Globo

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Não há na História da humanidade uma civilização que tenha se destacado no tempo, restado na lembrança dos seus povos e nos livros de História como paradigma, sem ter aliado à sua jornada política uma produção cultural exuberante. Foi assim na Grécia. Foi assim no Egito e em Roma. No Império Britânico, na Rússia imperial dos Romanov e na China da dinastia Ming. Os regimes que sufocaram a cultura acabaram desaparecendo da memória afetiva da coletividade. É esse o destino que acabam encontrando todos os governos que enxergam na cultura uma adversária a ser derrotada. Governos têm entre suas atribuições formais o fomento à cultura. Evidentemente o Estado não precisa produzir minério ou petróleo, nem fabricar parafusos ou pregos. Tampouco cabe ao Estado gerir teatros, casas de show ou cinemas. Mas é da sua competência incentivar as manifestações culturais do seu povo. Estados pobres não dão dinheiro ao autor e ao produtor de cultura, mas os incentivam por meio da redução de imposto...