As vezes não dá a menor vontade de aterrissar. Não faz o menor sentido aterrissar. Guilherme Arantes, no Facebook
Às vezes me dá vontade de não voltar. De não voltar pra
realidade, de não retornar para aquilo que deveria ser o meu lugar...às vezes
dá a impressão de que aquele lugar para o qual eu deveria voltar é apenas uma
lembrança vaga, nada mais existe, tudo mudou, todos mudaram, é como se tudo que
eu entendia como sendo conhecido agora fosse apenas um sonho e que a minha
viagem atual, que é um sonho, fosse a verdadeira realidade. E o pior, ou o
melhor de tudo é que eu sei que é assim
mesmo ! As vezes não dá a menor vontade de aterrissar. Não faz o menor sentido
aterrissar. Não dá nenhuma vontade de assistir os sonhos que agora são reais se
desmancharem na paleta de cores desmaiadas que é oferecida pelo mundo
fantasioso que se insiste em chamar de real. Lá fora, lá longe, lá atrás, no
que se chamava “normalidade” o mundo se debate e vocifera nas possibilidades
precárias do embate bruto das leituras possíveis dos sonhos de cada um, e eu me
sinto um nada, nadando, desesperado num mar se impossibilidades e de
naufrágios...Aqui, não. Aqui, no conforto da minha estaçãozinha de trabalho, eu
viajo no meu sonho. Aqui tudo é possível, não se esfarela e não se desmorona
como lá, na chamada “realidade”. Aqui, está o meu sonho grandioso e íntegro,
amadurecido de dentro pra fora num processo de qualidade total e compromisso
com a minha essência mais profunda. Aqui, o produto do meu sonho parece
completamente plausível, o meu voo não tem amarras, minha poesia não conhece
limites, a beleza, a delicadeza e a sutileza são plenamente possíveis e
realizáveis. Lá, naquele absurdo que um dia chamaram de realidade, o buraco é
mais embaixo. Sempre o buraco mais embaixo. Lá, a incompreensão e a
mediocridade vão sempre se contrapor a tudo de mais nobre que eu sonhasse. O
“sucesso” é como um rato que você precisa matar. E você não pode deixar um
buraco, uma fresta, um ralo sequer que sirva de escape para esse rato fugir. Se
houver uma mísera falha no reboco da parede, esse rato desgraçado chamado
“êxito” escapará. Aqui, na minha “estaçãozinha de trabalho, eu consigo
engendrar um mundo novo, onde cada idéia, cada criação vai crescendo, vai
crescendo, vai tomando forma, desabrochando como um milagre que me faz reviver
a cada instante... Aí, quando eu estou no auge da minha empolgação,
entusiasmado com a minha capacidade de ser criador, eu começo a pensar na interação que existirá
dessas maravilhas que eu estou criando com tudo aquilo que eu deixei lá atrás,
no momento em que decolei para a minha viagem desbravadora, tudo aquilo que
ficou lá no chão duro da “realidade”, todos os meios e veículos de acesso que
farão de tudo para impedir que os meus sonhos se espalhem e consigam
transformar o mundo... aí começa o meu pesadelo. Porque o mundo não quer ser
transformado. Porque o mundo faz de tudo para insistir na sua feiura e
mediocridade. Aí eu lembro que vou me encontrar com todas as formas de
corrupção e de deliberada incompreensão, porque o mundo tem uma natureza má, e
que essa natureza perversa só é vencida com muita dificuldade pelos sonhadores
que viveram voando como eu. Aí eu lembro que, se dependesse do que sempre foi
“normal” para o mundo, todos os delirantes e sonhadores da História teriam
desistido dessa mania de criar o novo. Quando eu lembro de todas as formas de
corrupção que os meus sonhos vão encontrar pela frente, quando eu lembro de
todos os obstáculos propositais que farão de tudo para impedir que os devaneios
de todos os sonhadores possam frutificar, eu tenho vontade de entrar de novo no
meu casulo da minha estaçãozinha de trabalho, onde tudo é possível. Será que eu
sou normal ao enxergar colorido ? Será que as pessoas como eu precisam de um
tratamento para voltarem a enxergar só em escala de cinza ? Ou a vida é assim
mesmo ?
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