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Mostrando postagens de 2019

Parágrafo único

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Encerra-se à força o ignóbil escárnio da distopia e de suas amásias próximas. Finda-se à bala a suruba da hediondez, escrotidão amontoada, lamaçal de bílis expelida como se sêmen fosse. Cerra-se a faca os portais da inimaginação, * infeliz moribunda/A vida lhe esvai,/Corre arredia,/ Indômita,/ A cavalgar no alazão do tempo,/ Sem rédeas, sem rumo, sem direção... E a poesia,/ Por covardia/ Faz companhia,/ Num vagar vadio,/ Sem rima, sem graça, sem inspiração.../. Acede à força o gozo do amor clandestino incondicional, degolando o tergal do onanismo desardido . Há de arder. Há de arder para todo e sempre /; apertar, inchar, tocar, dedilhar, vibrar, brandir, estremecer. Enforque-se em público lupanar o desalento e o fatalismo. Abra-se o mundo dos sóis orgásticos, faça-se felicidade eterna o grito esfuziante do cabaço dizimado, felícia dos prazeres. ** Aqui/ onde foi abolido o hímen/ úmido hífen/ Aqui/ onde a língua é dinâmica/ e dedos são talheres/ Aqui/ onde o grelo/ destrona o falo...

A névoa da guerra: Walter Bosshard, Robert Capa e o conflito sino-japonês. Por Joaquim Toledo Jr*.- Zum, revista de fotografia

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“Robert Capa, um dos raros mestres da novíssima arte da reportagem fotográfica, cujas fotos da guerra civil espanhola foram um dos principais furos do ano, está agora na China, fotografando outra grande guerra para a Life”, anunciava a edição de 16 de maio de 1938 da revista norte-americana. Ao contrário das imagens do conflito na Espanha, as fotos enviadas por Capa da cidade de Hankou — a “Chicago chinesa” e então centro militar do país, explicavam as legendas — não mostravam “morte e destruição”, mas a euforia pela primeira vitória militar do generalíssimo (comandante supremo das Forças Armadas) Chiang Kai-shek desde a declaração de guerra ao Japão em 1937, seis anos após a ocupação da Manchúria pelos japoneses em 1931.                                                A foto da capa, hoje icônica, mostra um jovem soldado chinês em posição de atenção, o r...

A incrível ressurreição do The Who - por Diego A. Manrique - El País, Madri

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Houve um tempo em que o The Who era sinônimo de rock. Rock visceral e instruído. Sua curva de aprendizado foi surpreendente: o quarteto dominou rapidamente a arte de criar singles fascinantes até se fimar no formato do LP, às vezes duplo e com vocação narrativa (o que foi chamado, grosso modo, de “ópera rock”). Seu líder e compositor, Pete Townshend, revelou-se um comentarista erudito da teoria e prática da música popular; abandonou o arrogante “espero morrer antes de ficar velho” para fugir do tópico do rock como música juvenil. E tudo isso enquanto a banda mantinha a força avassaladora de seus shows. The Who saiu de seu estado de graça de uma forma ruim, entre escândalos, broncas, tragédias. Sua seção rítmica foi se desintegrando, com as mortes repentinas do baterista Keith Moon e, 24 anos depois, do baixista John Entwistle. No final de 1979, 11 de seus fãs morreram durante uma correria na entrada de um show em Cincinnati.  Townshend, desencantado e mergulhado em ...

A Terra é plana, astronauta ministro?

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O tenente coronel da reserva da FAB, Marcos Pontes, foi o primeiro e único brasileiro a ir para o espaço. Literalmente. Em março de 2006, como astronauta, ele ficou 10 dias na Estação Espacial Internacional, ou seja, dava uma volta em torno da Terra a cada 90 minutos. O líder do movimento pelo imbecilato nacional, um esquisitão e aparentemente vadio chamado Olavo de Carvalho, espalhou que dizem por aí que que a Terra é plana. Grosseiramente explicando, digo eu, como uma gigantesca mesa de pingue pongue que gira, gira, gira em velocidade alucinante e se torna redonda. Entendeu? O astronauta virou ministro da Ciência e Tecnologia e, em janeiro, disse à Rádio Bandnews FM que “sinto um nó no estômago quando leio ou ouço que a Terra é plana. Isso é uma consequência dos problemas da educação no país em todos os níveis.” Em julho, ao jornal O Dia, respondeu que “isso é uma bobagem. É igual falar que água não é água. Existem muitas provas necessárias sobre a forma da Terra e de outr...

Nautilus

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As batalhas navais ensinam que diante do bombardeio os submarinos submergem. Submergir é proteção. “Sai, sai do sereno menino”, diz a canção que alerta que “sereno pode fazer mal”. Uma tradução urbana do ato de submergir. Se bem que não sinto o sereno há muitos anos. Nem ele, nem a garoa, nem a neve de Itatiaia. Itatiaia foi onde passei um dos melhores fins de semana de minha vida e a pior Semana Santa. “A vida é assim”, dizia Zora Yonara, astróloga do rádio e sua voz enigmática com eco que alertou por décadas: “você tem pela frente uma sequência de vitórias esplendorosas. Insista!”. A submersão é vital para a sobrevida. Basta ter ar suficiente e muita humildade. Castrar os ventos tortos da arrogância, deixar nossa nau existencial largada no fundo do mar, ao lado dos polvos e dos peixes abissais. Os tímidos vivem nos bancos de areia, cercados de corais. Parados, prestando atenção nos praticantes de evasão de privacidade (essa é do Tutty Vasquez) que exibem sua anêmica e minúscula burg...

Desamor à cultura, por Ascânio Seleme – O Globo

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Não há na História da humanidade uma civilização que tenha se destacado no tempo, restado na lembrança dos seus povos e nos livros de História como paradigma, sem ter aliado à sua jornada política uma produção cultural exuberante. Foi assim na Grécia. Foi assim no Egito e em Roma. No Império Britânico, na Rússia imperial dos Romanov e na China da dinastia Ming. Os regimes que sufocaram a cultura acabaram desaparecendo da memória afetiva da coletividade. É esse o destino que acabam encontrando todos os governos que enxergam na cultura uma adversária a ser derrotada. Governos têm entre suas atribuições formais o fomento à cultura. Evidentemente o Estado não precisa produzir minério ou petróleo, nem fabricar parafusos ou pregos. Tampouco cabe ao Estado gerir teatros, casas de show ou cinemas. Mas é da sua competência incentivar as manifestações culturais do seu povo. Estados pobres não dão dinheiro ao autor e ao produtor de cultura, mas os incentivam por meio da redução de imposto...

O prazer de fazer #HashtagCultural na Rádio Bandnews FM Rio

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Em 17 de outubro estreei a Coluna #HashtagCultural na Bandnews FM Rio e agradeço a todos vocês que ouvem, comentam, divulgam. Ela vai ao ar em FM 90,3 as sextas e sábados, as 5 horas, 20:30 e domingo 13:30. Gosto dos dias e horários por causa da diversidade de ouvintes. Impressiona o aumento da audiência no horário das 5 da manhã já que muita gente (mas muita, mesmo) está saindo de casa cada vez mais cedo para enfrentar o trânsito. Por isso é um sucesso o programa “Notícias da Manhã”, com muitos informes sobre trânsito, atualização de notícias do dia na cidade, previsão do tempo, apresentado de uma maneira bem leve, carioca. A nossa #HashtagCultural está no “Notícias da Manhã”. Desde a primeira coluna, todas podem ser ouvidas no site da Bandnews FM, é só clicar aqui: https://bit.ly/2rAgYwz . Já que estou convidando o que acha de dar uma olhada na recém-inaugurada (hoje) quitinete da Coluna lá no Instagram? Clique aqui: https://www.instagram.com/hashtagcultural/ Na...

Garantia, por Leon Eliachar

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A mulher virou para o lado, cobriu a cabeça com o travesseiro e falou, com a voz sufocada: — Desliga esse rádio, Élcio. Já é meia-noite e você precisa ir embora. Élcio nem dava bola. As palavras agora não eram tão importantes quanto os números. Aumentou o volume do rádio e falou: — Só mais uma urna. A mulher sentou-se na cama, indignada: — Só quero ver a sua cara, quando o meu marido chegar. Élcio sorriu: — E quem é que você pensa que estou ouvindo no rádio, meu bem?

Maiorca, por Anais Nin

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Eu estava passando o verão em Deya, na ilha de Maiorca, em um local próximo ao mosteiro onde se hospedaram George Sand e Chopin. De manhã cedo montávamos em pequenos jumentos para descer as estradas que davam acesso ao mar. A viagem tomava cerca de uma hora por trilhas de terra vermelha, pedras, perigosos blocos de rochas, por entre as oliveiras cor de prata até as aldeias de pescadores com seus casebres construídos ao sopé das montanhas. Todos os dias eu descia até uma enseada onde a água do mar era tão transparente que se podia ver os recifes de coral e a insólita vegetação no fundo. Uma estranha história a respeito daquele lugar nos foi contada pelos pescadores. As mulheres de Maiorca eram inacessíveis, puritanas e muito religiosas. Só iam nadar com os maiôs de saiote comprido e as meias pretas de antigamente. A maioria delas não gostava de nadar e deixava isso para as européias sem-vergonhas que passavam o verão na ilha. Os pescadores também condenavam os trajes de ba...

Quem foi Raul Seixas? Ou melhor, quem é Raul Seixas? Dois livros biográficos caçam a resposta

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Raul Seixas foi um grande compositor, poeta, um dos artistas mais completos e complexos de sua geração. Sua obra se perpetua porque se renova em uma metamorfose permanente, crônica. Mas quem foi Raul. Ou melhor, quem é Raul? Neste ensaio para a magistral, fundamental e cada vez melhor revista Quatro Cinco Um , ( https://www.quatrocincoum.com.br/br/home )   Carlos Macedo escreve que “Dois livros recuperam o impacto das canções e a trajetória de Raul Seixas, um dos maiores mitos do rock nacional”. Raso, largo, profundo. A mosca da sopa, os olhos do cego, o dente do tubarão. Os versos de Paulo Coelho interpretados por Raul Seixas em um de seus maiores sucessos, “Gita”, trazem definições que também se aplicam às virtudes e contradições do dono da voz. Nenhum desses aspectos é negligenciado nas mais recentes biografias do roqueiro baiano: Raul Seixas — por trás das canções , de Carlos Minuano (BestSeller), e Raul Seixas: não diga que a canção está perdida (Todavia), ...

40 anos de ‘Apocalypse Now’: assim foi o set mais selvagem da história

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Por Juan Sanguino - El País Como pode uma filmagem planejada para 16 semanas acabar durando 15 meses? No caso de Apocalypse Now, a façanha é que (quase) todos os membros da equipe tenham conseguido terminar o trabalho vivos. Seu diretor, Francis Ford Coppola, acabou acompanhando seu protagonista, o capitão Willard, no mergulho à loucura: se a missão do soldado era caçar o coronel Kurtz, a de Coppola era concluir um filme que havia começado sem roteiro e sem final. Ele mesmo reconheceria ter contemplado o suicídio em três ocasiões ao longo dos quatro anos de produção, quando tudo o que podia dar errado deu errado. E tudo o que ninguém nem sequer havia pensado que pudesse ocorrer saiu ainda pior. Nenhum estúdio de Hollywood queria nem ouvir falar de um filme sobre o Vietnã meses depois da derrota dos Estados Unidos na guerra mais controvertida de sua história. Coppola conseguiu o apoio da distribuidora United Artists, fundada por Charles Chaplin em 1930 para que os artist...