Preocupação, ou, pré-ocupação
Texto restaurado e remixado
Li um artigo numa revista científica sobre a ansiedade, que segundo a publicação (e todo mundo) é um dos grandes transtornos da humanidade. Entre os fatores que aumentam o estado, digamos, descabelado do indivíduo está a preocupação. A palavra diz tudo: pré-ocupação. Sofrer por antecipação aumenta as dimensões dos problemas e ainda inventa novos ingredientes transformando o imaginário num caos.
Uma piada que exemplifica bem é a do motorista da van. Ele dirige calmamente numa noite deserta, transportando 15 freiras que voltavam de um colóquio e de repente um pneu furou. O motorista encosta a van e verifica que o estepe também está furado. Bateu aquele desespero.
Sozinho, no escuro, responsável pela segurança de 15 freiras. Alguns minutos depois surge um capiau puxando seu burro cheio de carga. O motorista da van pergunta "amigo, você sabe onde encontro um borracheiro?". O capiau coça o queixo e aponta para uma luz distante. "Lá é a casa do borracheiro. É um homem meio invocado, mas é o único daqui".
O motorista da van, tomado pela preocupação ("é um homem meio invocado", havia dito o capiau), sai andando em direção da luz. Pensa "se ele abrir a porta com uma barra de ferro, eu dou um chute; "se ele abrir me xingando eu xingo também". Pensamentos e ideações só amplificam o drama.
Ao chegar à casa, bate na porta. Uma, duas, três vezes. A porta abre e um sujeito diz apenas "boa noite". Tomado pelos pensamentos, o motorista da van pega o borracheiro pelos cabelos gritando "boa noite nada, seu safado, moleque". E dá-lhe uma surra sem mais nem menos. Não resolveu o problema do pneu e, pior, criou outro com a polícia.
Preocupação é viver uma situação supostamente ruim, no mínimo, duas vezes: antes e durante. Sabe o resultado de uma prova que vai sair daqui a 20 dias? Muitas vezes essa espera é mais torturante do que a prova em si e o resultado também.
Anos atrás, fizeram uma pesquisa nas penitenciárias americanas e chegaram à conclusão que uma boa parte dos condenados que aguardava no chamado "corredor da morte" queria ser executada logo para cessar a agonia.
Qual é a solução para nos livrarmos de preocupações? Não é uma questão fácil. Especialistas dizem que mudar o alvo do pensamento assim que bater a preocupação é um bom caminho, já que só conseguimos pensar em uma coisa de cada vez. Mas esses mesmos especialistas ressaltam que é um exercício árduo que exige muita dedicação e, em muitos casos, terapia.
No caso do motorista da van, citado na piada, em vez de ir pensando na receptividade ruim do borracheiro, deveria ter imaginado outras coisas, olhar as estrelas, enfim, substituir os pensamentos negativos e liquidar as fantasias ruins e não ser engolido por elas a ponto de partir para o desatino.
A
preocupação está em todos os seres humanos. O que varia é o peso delas em cada
indivíduo. Por exemplo, quando era piloto de Fórmula 1, Nelson Piquet dormia no
cockpit do carro minutos antes de ser dada a largada, o que provocava
comentários generalizados. Na época ele dizia que relaxava "evitando
pensar na corrida", principalmente na semana do grande prêmio. Sem dúvida,
um raro privilégio.
A preocupação
inventa problemas ou, no mínimo, dobra o tamanho deles. Que tal começar a se
livrar disso?
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