Mulheres na Literatura, segundo a artista plástica SONIA XAVIER
Fui a inauguração de uma exposição de rara beleza. “Mulheres
na Literatura”, de Sonia Xavier, na galeria da Aliança Francesa em Icaraí,
Niterói, rua Lopes Trovão 52, segundo andar. De segunda a sexta das 8 e meia as
20 horas, sábados das 8 e meia ao meio dia, até o dia 12 de outubro.
Sonia superou
todas as minhas expectativas ao transportar para telas magníficas a essência, a
urgência, a beleza radical de todas as mulheres por ela “traduzidas”. Uma
exposição de rara beleza que os leitores não devem deixar de visitar. Em nome
das artes plásticas, da literatura, da essência existencial feminina.
O renomado e muito querido escritor e psicanalista
Herculano Farias definiu a exposição com precisão e beleza no texto de
apresentação:
“Criatura e criador, aqui, se confundem.
Há
três olhares para se ver uma obra de arte. Um-senso comum-busca figura restrita
ao seu repertório cotidiano. Outro, que interpreta, seguindo os rumos do seu
imaginário.
Arte
é o espaço em que Deus faltou, de propósito, reservado aos homens.
Então, surge
o artista, que inventa, reencanta o mundo comum-busca figura restrita ao seu
repertório cotidiano. Outro, que interpreta, seguindo os rumos do seu
imaginário. Este, abstrai e projeta veredas pescadas no próprio universo do
inconsciente. Interpreta, seguindo os rumos do seu mundo pessoal. E o terceiro
olhar, que denuncia, devaneia, entre o figurativo e o abstrato, em técnicas,
materiais, formas, luzes, cores, somados e delírios surrealistas e transcendentais.
O
trabalho de Sonia Xavier se aproxima inequivocamente, do terceiro olhar. Uma
coisa, ela diria, é madame Bovary; outra a que busca representar em tela. Vale
repetir aqui, neste caso, com Flaubert; “madame Bovary c`est moi”.
Mulheres
na literatura é uma viagem de gratidão e homenagens a grandes autores e suas
criações femininas.
Capitu,
tendo vindo de Machado de Assis, ganha expressão plástica nas mãos da artista.
Capitu (Machado + Sonia) não se trai no seu desejo de se fazer mistério.
Ana
Carenina, do velho conde Tolstoi, de Iasnaia Poliana, é redescoberta por um
pincel de inusitada montagem, numa ´assemblage `inesperada. Dama algo trágica,
controversa. Apaixonada sempre, acabando por matar-se nos trilhos de um trem.
Clarice
não é um retrato mas uma revisão transcendental de encontros com a artista.
Penélope
e Circe saltam da Odisséia para visitar o mundo de agora, tendo ciência de que
não passam de mitos.
No
universo do humano, tudo são mitos.
Duília,
do nobre Anibal Machado, é a iconoclastia do desejo, para não dizer de sua
eterna e revigorada volta. Desejo adolescente revivido com atraso de 40 anos. É
o tempo, o envelhecimento e o prazer.
Inês
de Castro, uma porfia poético-camoniana.
Ismália,
regresso a um passado puro sonho inatingível. Há uma torre invisível, uma
loucura à vista, e a estibordo da existência, a fome de dias luas, como em
Calígula, de Camus.
A
vida é pura dança de mistérios. E vem Carmem, cheia de sedução, e não musical,
como em Bizet, porém carnal e melancólica como em Prosper Merimée, seu legítimo
criador.
Pagu,
morada de amores, guerrilhas, fortemente criança e guerreira, perigosa e
irretocável no simples desejo de apenas ser.
Tieta
do Agreste é Jorge Amado, romancista de cordel (como se fosse) que se esqueceu
de nos ofertar mais anos de sua própria vida...
Helena,
a de Tróia, bela e amante, aventureira, capaz de destruir esquadras e deixar
marcas na humana lida, para completar seu curso superior de “fadada a ficar na
História”.
Mariana,
a dos sonhos, é o devaneio, algo Machado e Victor Hugo (haja vista Os
Trabalhadores do Mar) meio botão, entreaberta rosa, na plenitude de anseios e
utopias erótico-existenciais. Lá estão inscritas flores, velhos pais, promessa
de futuro amor ainda fora de seus sonhos sexuais – no alto, o efebo, fora da
árvore mas próximo dela, como um aceno para o futuro encontro.
De
que trata, por fim, a exposição Mulheres na Literatura, senão dos sonhos e dos
devaneios da própria artista?
O
que fazem os artistas além de divagar sobre a existência? Todo artista está
colado na vida, desde sempre. Insere-se em tal ou qual contexto social, desde o
homem das cavernas que fazia suas interferências no histórico da raça, inscrevendo-se
nas rochas, como, na arte contemporânea, o criador se instala em praças
públicas, nas areias de um deserto, nos eventos de arte pelos museus afora,
gerando novos conceitos e folguedos plástico-filosóficos.
Cola-se na vida, e
propõe, a cada gesto, instalações, criações, novas nuances de possibilidades de
existir, denunciar ou, serenamente, homenagear figuras e mitos para sempre
exemplares.
Mulheres
na Literatura é mais um gesto que busca esculpir no espaço, jovens e antigas expressões
do ser.
Está
claro que, na história da pintura, todos os artistas se encontram Visconti com
Cimabue, Van Gogh com Delacroix, Matisse com Manet, Monet com Klint, todos se
encontram na expansão dos seus desejos e fantasias pessoais. Uns melhores que
outros? Que seja. Há o encontro. Isto é que se constitui na essência do
existencial.
A
exposição é um diário íntimo de sonhos, fantasias e revelações. Sonia Xavier,
percorrendo mulheres na literatura, personagens ou escritoras, projeta, com sua
arte, a estrutura lírica do seu mundo interno.
Aos
pés da árvore (da vida) em plena solidão criativa, a mulher sonha.”
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