Em um relacionamento sério - Juliano Martinz, biógrafo e escritor catarinense
Alterou seu status de solteiro para “Em um relacionamento
sério”. Viu aquilo? No canto da boca dele? Foi um sorriso. Sim, foi pequeno, eu
sei. Discretíssimo, convenhamos. Mas estava ali.
Entre as andanças virtuais, Munhoz acabou se deparando com
Gabriela. Ela tinha incríveis lábios carnudos, pele alva, e irresistíveis olhos
amendoados – uma musa da literatura universal. Parecia ser da alta sociedade –
as fotos denunciavam isso.
Provavelmente, era a garota que esperava pelo príncipe
encantado: neste caso, um atraente e experiente homem de 35 anos, inteligente,
sem vícios, e gerente de multinacional.
O problema era que Gabriela não tinha as melhores intenções.
Na verdade, ela era líder de uma quadrilha que aplicava todo tipo de golpe. E
entre as operações estava atrair e roubar homens ricos e solitários.
Gabriela estava no ramo havia 2 anos, e já aplicara o golpe
mais de uma dezena de vezes. Adquirira uma poderosa habilidade em identificar
traumas e dores das presas, e utilizava uma conversa macia para envolver os
solitários.
E agora, após salivares conversas virtuais, intensas ligações
telefônicas, decidiram se conhecer.
Encontraram-se em um restaurante famoso, onde Gabriela
derramou todo seu charme entre fala suave, gestos cuidadosamente alinhados, as
mãos arrumando os cabelos em intervalos regulares, sinalizando interesse
romântico.
Munhoz estava boquiaberto. Parecia um jovem apaixonado.
Gabriela podia ver a intensidade emocional do homem lampejando brilhos intensos
em cada olhar. A presa estava no ponto.
Para isso, ela precisava que Munhoz a levasse para a casa
dele. Depois, era só seguir o cronograma estabelecido e mantido nos últimos
dois anos. Pediria mais uma taça de vinho e, enquanto ele estivesse
desprevenido, despejaria uma dose cavalar de ansiolítico GHB em sua bebida.
Após isso, teria horas a sua disposição para fazer uma limpa na casa de Munhoz:
dinheiro, joias, cartões e aparelhos eletrônicos.
Por isso, Gabriela tinha pressa. A tensão pré-roubo mexia com
suas emoções. Após o jantar e duas taças de vinho, disse:
– Vamos, querido?
– Para minha casa? – perguntou Munhoz, com um sorriso
abobado.
Gabriela selecionou seu sorriso mais arrebatador e exclamou:
– Algo me diz que esta noite será longa.
No carro dele, Gabriela sentiu sono. Não se lembrava de ser
tão fraca para bebidas. Decidiu tirar um cochilo durante o caminho até a casa
de Munhoz. Acomodou-se no banco, e adormeceu.
___
No dia seguinte, Gabriela acordou… em sua cama. Não deveria
estar na casa de Munhoz? Sua cabeça doía intensamente. Latejava como se facas
vazassem seu cérebro. Estranho! O que acontecera? Olhou ao redor. Tudo estava
fora do lugar. Tudo. Mas o que…?
Ela ainda precisaria de uns dois ou três minutos para
perceber que Munhoz fizera uma limpa em sua casa.
___
Naquela mesma tarde, Munhoz apagou seu perfil. Criou um novo
com o nome Alvarenga. Dias depois, ele alteraria seu status de “Solteiro” para
“Em um relacionamento sério com Cristina”.
Comentários
Postar um comentário
Opinião não é palavrão. A sua é fundamental para este blog.
A Comunicação é uma via de mão dupla.